Mensagem do Grupo de Discussão Ciência Cognitiva

Participe deste grupo através da página http://br.groups.yahoo.com/group/cienciacognitiva


From: Rosane M. Miyke <r_m_miyke@uol.com.br>
>
>Olá a todos, meu nome é Rosane e recentemente tive contato com o assunto "IA".
> Achei fascinante e gostaria de saber mais a respeito. Acho que encotrei o
>lugar ideal para sanar minhas dúvidas e adiquirir conhecimentos na área.
>Cheguei a esta lista através de pesquisas feitas no Google e vi a seriedade
>com que tratam o assunto por isso resolvi me juntar a vcs. Já vou avisando que
>é meu primeiro contato com o tema por isso peço que não achem estranho quando
>eu fizer alguma pergunta digamos "demasiadamente primária". Espero que
>possamos nos dar bem.
>

Não tenha receio de fazer perguntas "primárias". Eu sou da opinião de
que certas perguntas simples podem exigir considerável reflexão, além
de propiciarem oportunidade para se rever as "coisas simples" sob
outros ângulos.

>Logo para o início já tenho algumas dúvidas sobre o assunto, por favor, alguém
>pode me explicar algo sobre o mecanismo de associação de idéias e os trabalhos
>de Hebb? Comentaram isto em uma aula mas foi pouco aprofundado e fiquei com
>isto na cabeça.
>

Não há muita relação entre associação de idéias e aquilo que Hebb
propôs, embora muitos façam uma exposição simultânea desses conceitos.

Associação de idéias é um termo que frequentemente é usado para
expressar uma natural ocorrência de certos conceitos nos mesmos
contextos. Assim, quando falo em "enfermeiras", surge em nossa
mente diversas idéias correlatas (hospitais, pacientes, doutores,
curativos, etc.). Esse tipo de investigação é muito antigo,
podendo ser encontrado desde Aristóteles. Os empiristas
britânicos avançaram muito na investigação disso e no começo
do século passado (XX) uma escola inteira da psicologia (o
behaviorismo) foi fundada em cima de certas idéias desse
potencial de associação entre as coisas. As investigações
cognitivas mais recentes conseguem determinar muitas
características dessas associações, através de experimentos
no qual se mede o tempo de resposta em situações de priming
semântico.

Donald Hebb propôs (em 1949) algo um pouco diferente. A idéia
básica de Hebb era postular o comportamento dos neurônios a
nível individual. Quando dois neurônios ficavam ativos ao mesmo
tempo, a ligação entre os dois recebia um reforço (ou seja,
ficava mais eficaz), o que fazia aumentar a influência futura
que um teria no outro. Isto permite o desenvolvimento de
redes com o poder de efetuar deteção de correlação temporal.

Embora isso possa lembrar a associação de idéias, as coisas
são diferentes. No caso de Hebb, essa associação se dá a
nível neural. Na associação clássica de idéias, isso se
dá a nivel de conceitos, que possivelmente requerem a
intervenção de milhares ou milhões de neurônios, e cuja
forma de codificação é ainda objeto de investigação.

Até mais,
Sergio Navega.

-----Original Message-----
From: Rosane M. Miyke <r_m_miyke@uol.com.br>
> Olá a todos, como vão?
>
> Tenho outras dúvidas (isto é só um exemplo, vou colocando aos pouquinhos
> as perguntas para não assustar vcs, ...rs):

São dúvidas muito interessantes. Espero que outros também comentem
sobre estes assuntos, pois a lista está muito quietinha. Aqui vai
minha colaboração.

> - Como age o sistema nervoso de uma criança quando ela está aprendendo a
> andar, ou seja, o comando dos seus músculos, o equilíbrio. Como o sistema
> nervoso "aprende" como deve ficar em pé, por exemplo???

É, obviamente, um processo bastante complexo. Quando uma gazela nasce,
em poucas horas ela já consegue andar e tem como fugir de eventuais
predadores que estejam próximos. Esse é um bom motivo evolucionista
para que o cérebro desse animal já disponha, de forma inata, de vários
circuitos neurais "pré-programados" para coordenar músculos. Só que
isso representa uma certa perda de flexibilidade, pois esses
circuitos não se desenvolvem muito mais. Tudo o que é inato em
geral tem pouca flexibilidade.

Já em um bebê humano, a evolução inverteu a situação. Nos humanos,
a principal característica é ter um cérebro com pouquíssimo nível
inato de organização neural. Praticamente tudo tem que ser aprendido
(e é por isso que os primatas têm que dedicar um longo período de
suporte aos seus filhos, o que também mostra razões da necessidade
de ligação forte entre os casais, mas isso é outra história
comprida).

O que o bebê tem que aprender é um problema com duas partes: ele
precisa aprender a perceber visualmente (e também tatilmente) e
precisa aprender a dinâmica de coordenação dos músculos. Isto
envolve uma atividade na qual o cérebro fica no meio de um
ciclo de percepção/ação, onde padrões neurais de ativação
motora são correlacionados com a percepção visual de movimentação
dos braços, pernas e do corpo (ou seja, o efeito da ação muscular).
Esse processo é essencialmente por tentativa e erro e envolve
fundamentalmente aprendizado de correlação.

Isto também ocorre em adultos. É só lembrar-se de quando você
aprendeu a dirigir automóveis. Controlar o pé da embreagem enquanto
se acelera é o terror dos novatos. Mas após um período de
treinamento, o cérebro se adapta para executar essa tarefa.
Se adapta tão bem que o processo inteiro começa a ser executado
de forma inconsciente. O novato fica com toda a sua atenção
consciente focada no processo. O motorista experiente pode
conversar sobre sofisticados assuntos enquanto dirige.

> - Que tipo de soluções existem para que uma rede neural pudesse reter
> informações previamente aprendidas e ao mesmo tempo continuasse aprendendo
> novas informações???

Os modelos convencionais de redes neurais (artificiais) tem um problema
chamado "interferência catastrófica". Após treinar uma rede para uma
sequência de padrões, se você treiná-la para uma sequência diferente,
mas associada às mesmas saídas originais, ela "desaprende" as antigas
e substitui pelas novas. Isto é claramente oposto ao que é feito
no cérebro humano, pois normalmente nós nos lembramos de nossos
"erros" para compará-los com os acertos. Há soluções para isso,
mas considero-as meio fracas, pois parecem "remendos". Os modelos
de RNA da cognição humana tem sucessos em algumas áreas isoladas,
mas não são boas implementações para o problema "geral".

> - O que é plasticidade e estabilidade de RNAs???

São duas coisas distintas. Plasticidade é um tópico pouquíssimo
explorado em redes neurais artificiais (só conheço poucos trabalhos).
Mas é um dos processos mais importantes que ocorrem nos neurônios
biológicos. Conforme são submetidos a experiências, os neurônios
próximos de entrada sensória se adequam a essas experiências,
inclusive criando *novas* sinapses (ligações neurônio-neurônio).
Esses crescimentos (que lembram um pouco a proposição de Hebb)
são fundamentais para o processo de auto-organização da rede,
pois ela procura se adequar para o processamento das informações
que recebe. A plasticidade também ocorre às avessas: áreas que
deixam de ser utilizadas são progressivamente atrofiadas.
O fenômeno da plasticidade é mais visível em pessoas que
tiveram problemas como derrame ou acidentes com pequena perda
de massa encefálica. Em alguns casos (dependendo da dimensão
da perda) algumas capacidades são recuperáveis através de
exercícios.

Estabilidade é algo que afeta tanto as biológicas quanto as artificiais.
Nas artificiais, se a rede não é bem projetada ou se alguns parâmetros
não são bem acertados, a rede toda pode perder soluções ótimas (ficando
"presa" em mínimos locais) ou então pode entrar em comportamentos
oscilatórios. Esses comportamentos podem aparecer, por exemplo, se
o parâmetro "ritmo de aprendizado" é sobredimensionado. Por isso
alguns autores consideram que "acertar um modelo" de RN exige um
pouco de "mágica" do pesquisador.

Até mais,
Sergio Navega.

From: Rosane M. Miyke <r_m_miyke@uol.com.br>
>
>Qual a diferença entre raciocínio baseado em casos em IAC e IAS?
>Quando, por exemplo, em um sistema especialista implementamos "regras",
>como é que o sistema apresenta essas regras de uma determinada consulta
>sob uma forma compreensível para o homem? É diferente em IAC do que em
> IAS??? Como isto é tratado pelo sistema???
>

Rosane e lista,

Se com IAC você quer dizer Inteligência Artificial Conexionista e
IAS sendo IA Simbolista, então o raciocínio baseado em casos
(CBR-Case Based Reasoning) deve ser visto como sendo uma tática
mais importante em IAS.

Um sistema especialista não é bem um CBR. Em um CBR, um problema
proposto ao sistema sofre uma comparação com a base de casos
do sistema. Se uma solução é encontrada na base, ela é implementada
imediatamente. Se uma solução *similar* é encontrada, então
ela é recuperada, alterada para conformar-se ao caso presente
e aplicada para resolvê-lo. Essa solução alterada pode constituir-se
em um novo caso, suficientemente diferente do original. Nessa
situação, o sistema irá armazenar esse novo caso em sua
base de problemas e assim aumentar o "conhecimento" do sistema.
Essa é uma tática que tem certa significação cognitiva.

Até mais,
Sergio Navega.


Seminários Digitais Intelliwise

Seminários Sobre Inteligência, Criatividade, Ciência Cognitiva
Assista a esses seminários via Internet, sem sair de casa!

Clique Aqui Para Saber Mais!

Volta ao Menu de Mensagens

Seminários Sobre Inteligência

Homepage de Sergio Navega

Comentários?  snavega@attglobal.net